segunda-feira, 21 de maio de 2012

Sonho versus Vocação

Como estou tratando de um assunto delicado e – descobri com um susto – comum, que fique claro que o caso e as ideias são unicamente individuais.
Há algum tempo, uma grande amiga minha entrou num embate psicológico quando foi se decidir para qual curso prestaria vestibular. Sem me colocar em seu lugar, eu gritava em plenos pulmões que ela deveria prestar para o que ela realmente sonhava. Sem contestar. Por razões que não precisam ser enunciadas, minha amiga acabou escolhendo um curso que não era tanto assim sua cara e, por mercado de trabalho abrangente, ela passou e cursou. Não muito tempo depois, minha amiga revelou que não estava feliz no curso e eu disse com toda pompa: “não te avisei?!” – ainda, claro, sem me colocar em seu lugar. Nunca pensei, é claro, que eu estaria em seu mesmo lugar pouco tempo depois.
Encontrei-me, assustado, no ano seguinte, numa dúvida esquisita de qual curso prestar (esquisita porque são cursos praticamente iguais e poderiam me levar ao mesmo lugar, se eu quisesse). Tinha medo do que escolher, porém era um medo superficial, já que o meu sonho é apenas um: música. Cantar.
Mas o susto que tomei logo após foi de uma mulher um tanto feia que nem sempre anda ao nosso lado, já que não gostamos muito de olhá-la: a Realidade. Sempre me amarrei firmemente ao discurso clássico que a indústria publicitária adora pregar: “Viva seu sonho! Corra atrás sem se importar com as consequências, não desista! Você merece!”, o que me vendou para o que realmente a vida nos faz escolher num dado momento. A venda normalmente sai quando temos que respirar e nos perguntar num suspiro, suando frio: “Droga, o que diabos eu faço?”.
Eu sempre fui muito bom em escrever. Sempre gostei de Linguagens e Línguas, minhas melhores notas sempre foram nas matérias relacionadas a essa área. Eu sempre fui o chato que fazia textos extrapolando as linhas exigidas, o que ficava retinho nas aulas, o queridinho da titia de Português. Até pouco tempo meu sonho era ser jornalista – até eu descobrir a música.
É tudo culpa de minha amiga Indira (se estiver lendo isso, cacetada, foi você mesma!) que me apresentou o canto de uma forma tão shakespeariana que me dediquei mês após mês, anos após ano, em melhorar dicção, extensão vocal, impostação: tudo sozinho. A música invadiu a minha vida como um tsunami e me embriagou com o seu universo de prazer, amor e até a parte ostentativa da coisa. Eu amo cantar. É como Indira mesmo disse uma vez, num momento inocente de nossas conversas assanhadas: “eu só sei ser feliz cantando”.
E eu finalmente entendi minha amiga Larissa. Essa guerra ideológica nos desgasta profundamente, logo que há dois valores em jogo: fazer o que você sabe fazer e que sabe que se fizer vencerá, e fazer o que você ama mais que tudo fazer, mas o caminho até a vitória é incerto e de pedras. Para sanar a provável curiosidade do meu caro leitor, eu ainda não me decidi; na verdade, estou escrevendo este texto justamente pela interrogação que está nos meus pensamentos. Vou decidir entre ser racional e louco; escrever entre o certo e o incerto.
Se bem que eu sempre pendi pros desafios...
Sei lá. 

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Égua Meu

A dinamização óbvia na novela das seis sobre o Pará e a cultura paraense anda tornando, em parte, a coisa um tanto banalizada – até mesmo exagerada, em certos pontos, valendo-me do educado eufemismo. O exagero no uso de palavreados paraenses, por exemplo, chega a enjoar – e em nosso estado (sou paraense), algumas vezes até faz rir. Nunca um paraense esteve tão “aruá”; nunca um “égua” soou tão hilário.
Conversei com um gaúcho há pouco tempo sobre o assunto e ele me revelou que para ele era também cômico – valendo-se do santo eufemismo também, provavelmente – ver um “não nativo” forçando palavreados regionais que estamos acostumados a crescer ouvindo com uma fluidez simples. Direta, sem travamentos na pronúncia; ambos concordamos com a estranheza auditiva quando nos deparamos com situações do tipo. Das mais complexas variações às mais simples formas de falar: quando a fala é nossa, a gente deita e rola nela da forma que só a gente sabe fazer.
Grande e maior exemplo de uma típica gíria paraense e, sem dúvidas, a mais ouvida no dia-a-dia (não é o “jururu” que tanto repetem na novela – perdão pela decepção): “égua”. Aqui, “égua” é sentimento. “Égua” é lírico. “Égua” é poesia – “égua” devia estar no dicionário de tanto ser verbalizado por milhões de pessoas dezenas, centenas, milhares de vezes por dia. O maravilhoso “égua”, com suas mil e uma utilidades para o vocabulário, nunca nos deixa na mão. Na saúde, na doença, na tristeza, no espanto, na decepção, na felicidade, no choro ou no riso: o “égua” lá está, dissílabo e bem intencionado (ambíguo nos ouvidos mal treinados), para nos ajudar nos fraseares da vida e na formação da identidade regional.
É por isso que é válido quando é dito que não há como imitar um dizer ou agir regional. Pode ser o ator que for, com o talento que for: é regional. Neste caso, é paraense. Sendo “égua”, sendo “jururu” ou “aruá”: é de Belém do Grão-Pará, terra do açaí e do tacacá. É todinho meu. É marca minha, tatuagem minha. E o que é meu ninguém consegue fazer igual.